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Feminismo sem saída

terça-feira, 14 de setembro de 2021

Atualizado às 07:55

Escrevo a coluna de hoje a partir de uma crítica da Élisabeth Badinter, em seu best seller Fausse Route, do ano de 2003. O livro tem uma questão interessante na tradução para o inglês. 

Em 2006, a obra ganhou o título Dead End Feminism, em sua tradução inglesa da Polity Press, Cambridge. Só que Fausse Route, no francês, não significa necessariamente "sem saída", podemos interpretar apenas como "caminho errado". 

Badinter está alertando que o feminismo está sem saída ou tomou o caminho errado. É claro que uma rota equivocada pode nos levar a um destino sem saída. É exatamente isso que analiso hoje. 

A autora é uma daquelas pessoas que criticam a cultura da vitimização (sim, esta é uma crítica acadêmica, não apenas uma panaceia das redes sociais). Ela culpa as feministas radicais Andrea Dworkin e Catherine McKinnon por tornarem o feminismo vitimista, demonizando a sexualidade masculina. Essa estratégia levaria ao separatismo sexual. Homens e mulheres tomariam caminhos distintos na vida. 

O tema de hoje não é sobre a eterna rixa entre feministas liberais e radicais. Eu sei que a coisa é mais complexa do que isso e que os discursos contrários à exploração sexual possuem o seu valor. Quero apenas realçar que as previsões separatistas estão se concretizando. Na melhor das hipóteses, tomamos, nas políticas sexuais e de gênero, o caminho errado. 

O problema está cada vez mais claro. Quem está atento às tensões sexuais já percebeu isso. O feminismo de hoje não é nem liberal nem radical. Ele não está em busca de base. É a ideologia do desconstrutivismo social unida ao capitalismo, com purpurinas interseccionais. A interseccionalidade atual é como a canela, que se pôe em um café velho e amargo, para disfarçar o seu gosto ruim. Esse sistema global de gênero assexual é o que chamo de feminismo mainstream, aquele que não tem saída. 

Se o caminho leva a lugar nenhum, é necessário retroceder. Do contrário, a derrota e a rendição são inevitáveis. Não tem jeito. Dizemos que o feminismo está sem saída por vários motivos. Cada uma das divergentes terá a sua própria análise, que não são tão conhecidas pelas mulheres, pois o mainstream some com elas, como se escondesse doces de crianças. 

Particularmente, entendo que o feminismo entra em decadência por quatro motivos: a) a tese da bibliografia dominante está equivocada: homens e mulheres são diferentes, sendo os traços biológicos importantes na ordenação dos papéis flexíveis de gênero; b) o separatismo inevitável: a resistência dos meninos e homens ao desconstrutivismo social se torna cada vez mais complexa, aprofundada e digna de estudos; c) a assimetria dos problemas sexuais: homens e mulheres possuem problemas distintos e relacionáveis. Isso significa que a vida da mulher pode piorar, quando as políticas públicas pioram a vida do homem; d) a aliança entre feminismo mainstream e capitalismo: homens e mulheres com poder se unem para aumentar os seus benefícios, em detrimento de todos os outros e outras. É a crítica da Nancy Fraser. 

Diante dessa crise existencial, o que tenho feito é pesquisar, na história do feminismo, quem foram as mulheres e homens que incomodaram o movimento. Principalmente, quem foram as mulheres que foram expulsas? E por quê? 

Há muito o que se falar sobre esse assunto, que é interessantíssimo, demonstrando que a sisterhood não é tão cintilante assim. Agora, no entanto, concentro-me no que é mais importante, e não no que é mais divertido. Essas resistências, em sua différance, compõem o corpo disforme do feminismo marginal, que se opõe à unicidade corrupta do feminismo mainstream. 

Essa tensão entre as mulheres ainda não chegou à ruptura, mas é uma questão de tempo. Ainda existe a utopia da criação da ekklesia. Ainda há a percepção de que as mulheres podem se unir em uma classe, formando um corpo político permanente. Algumas também pensam que podem ignorar o desconstrutivismo social, achando que nada de mal acontecerá com as suas famílias. Essa ilusões podem se desfazer em breve. 

Se isso ocorrer, o feminismo marginal entrará finalmente em cena, cobrando a conta dos enganos. Será tarde demais, se estivermos na iminência de ficar sem saída.